segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Em tempo de macumba - 1972

Capa da edição que ora comentamos, com uma ilustração representando Heitor dos Prazeres e João da Bahiana fazendo um "sambacumba". É, meus senhores, o samba surgiu nos terreiros de macumba, mais precisamente na casa de Tia Ciata, onde Mário de Andrade (no romance "Macunaíma, O Herói Sem Nenhum Caráter") nos relata que o samba era logo depois da função religiosa; até hoje, o samba é um ritmo de percussão sagrado da Umbanda e, se não me falha a memória, da nação angola também... E esses dois bambas foram, por assim dizer, os pais espirituais do samba, pois, como se pode ver neste LP e na obra deles, os dois foram gênios tanto no samba profano como na macumba...



Capa da edição original, de 1958


01.
Vamos brincar no terreiro;
02.Ogum-Nelê;
03.Conga;
04.Pai Joaquim de Angola;
05.Vovó Joana do Aguiné;
06.Oxum-Maré;
07.
Nego Véio;
08.Vai I-Ao;
09.Ago-Iê;
10.Ogum Yara; 1
1.Homenagem a Oxalá;
12.Aruanda;
13.Rainha do Mar.


Saudações a todos! Já faz tempo que eu tenho vontade de comentar esse LP, e vou encerrar as postagens do ano (que, em matéria deste blog, não foi tão produtivo quanto eu esperava que fosse; as postagens foram muito poucas porque a inspiração devida nos faltou e nossos compromissos truncaram muitas idéias que eu pretendia botar aqui) com essa aqui que ora estou escrevendo.


Este LP, apesar de ter vários links para download na web, contar com a participação de mestres como João da Bahiana, Heitor dos Prazeres, Ataulfo Alves e Jorge Fernandes (o menos conhecido de todos) e ter tido três edições diferentes (com uma capa bem chocante na primeira, que mostra o corte ritual de um galo por uma mãe de santo[?], também mostrando uma moça[?] que aparentemente está lambendo o sangue do galo que lhe escorreu na mão - talvez seja um[a] orixá/entidade incorporado[a] - só pra fazer os carolas evangélicos, os vegetarianos e as associações protetoras dos animais surtarem), não tem sido valorizado e/ou comentado na sua importância para a música brasileira.


Como eu e mais pessoas de (muito) mais calibre que eu defendemos, a música popular brasileira, tal como a concebemos hoje, tem o seu pé (não um só, mas bem certamente os dois) dentro dos rituais religiosos de matriz afro-indígena. Principalmente o samba, que não só é um ritmo percussivo sagrado neste rituais que citei, mas também surgiu como música profana dentro de um espaço sagrado: a casa de Tia Ciata, que não só era mãe de santo como reunia em sua casa os grandes músicos populares e boêmios das primeiras décadas do século passado (aliás, é bastante esquisito nós, que vivemos até agora a maior parte de nossas vidas no século XX, termos que nos referir a ele como o século passado, dá a impressão de muita distancia temporal do que comentamos e sobretudo dá a impressão de que somos velhos, por sermos, apesar de não termos alcançado os 30 anos, homens do século passado); João da Bahiana e Heitor dos Prazeres estavam entre os frequentadores desta tão afamada casa, que está descrita (como já falei em outra postagem) em um dos capítulos do livro "Macunaíma, o Herói Sem Nenhum Caráter" (leiam o livro e vejam o filme que se baseou neste livro; é um dos raros casos em que o filme é melhor que o livro)...


Pois bem, meus senhores, neste disco temos ainda a participação do grande Ataulfo Alves e ainda a participação de Jorge Fernandes (dos quatro o menos conhecido), com bonitas fantasias musicais baseadas em cantigas religiosas da umbanda. Enfim, é um disco que mostra a música brasileira nas suas origens mais íntimas (e sempre renegadas). Como pesquisador (não tão hábil, mas vou dizer um dos pioneiros - olha a modéstia indo pro ralo!) deste tema, posso dizer que muita coisa está por se escrever e por ser pesquisada nesse respeito (as origens religiosas da música popular, ou mesmo sobre a música religiosa das religiões de matriz afro-indígena), só esperando que denodados cientistas humanos façam a sua parte e dêem suas contribuições nesse campo.... (se você conseguir domar sua preguiça para ler o que escrevi a respeito disso - a monografia que escrevi como exigência da Licenciatura em História pela Universidade Federal de São Paulo - está aqui: https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=explorer&chrome=true&srcid=0B4qdFTP4R1vLZDY4Njk2NDgtOWQ5NS00YzcyLThiZjctYTA1NmZkYTk4Nzdj&hl=pt_BR)



E aqui termino as postagens deste ano... No ano que vem, vou ver se consigo dar corpo a tudo que pretender publicar aqui, pois como bem disse uma colega blogueira (vai na minha lista de blogs favoritos e procura o blog "dois enes"; você verá o que essa colega andou escrevendo), "escrever é difícil pacas!" E a cada dia isto tem sido mais verdade; este post demorou mais de uma semana pra ser editado, porque o Blogger andou com uns problemas que não permitiam a formatação das postagens.. E vou fechar com esta letra, que é da faixa que escolhi para degustação de costume:

"Din din din, din din din,
Vamo saravá Pai Joaquim,
Din din din, din din din,
Vamo saravá Pai Joaquim!

Já encourei o pandeiro,
Já afinei a viola,
Agora vou pro terreiro,
Chegou Pai Joaquim da Angola"


Para ouvir a faixa 04, "Pai Joaquim da Angola", na interpretação de Ataulfo Alves, é só ir aí embaixo:
http://www.esnips.com/displayimage.php?pid=33019137

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Fundo de Quintal - Nossa Verdade - 2011


01. Nossa Verdade; 02. Lá Debaixo Da Tamarineira; 03. Teu Jogo; 04. Fé Em Deus; 05. Cacique a Consagração; 06. Coisa Da Raça; 07. Fera No Cio; 08. Passou Da Hora; 09. O Bom Sonhador; 10. Subtração; 11. O Poder De Curar; 12. Romance Proibido; 13. Nossa Bossa; 14. Luz Da Alvorada; 15. Conselho/ Insensato Destino.



Saudações a todos! Depois de um longo tempo sem escrever nada para este blog e ver as visitas a ele caírem vertiginosamente, tudo pela maldita falta de inspiração... E vamos então retomar à carga com um dos mais tradicionais e melhores grupos de samba e pagode, o Fundo de Quintal.E vou dizer que o disco que ora comento foi uma grata surpresa, pois fazia muito, mas muito tempo (precisamente desde o "Festa pra Comunidade", de 2003) que o Fundo não lançava um disco de estúdio prestável; parecia que as saídas (pacífica e sem brigas de ego, diga-se de passagem) dos ícones Arlindo Cruz e Sombrinha ( o primeiro em 1994 e o segundo em 1992, salvo engano) e do violonista e grande poeta Cleber Augusto (em 2004) haviam ferido de morte o talento do grupo, e que este sobrevivia mais de sua fama passada do que de seu trabalho presente...


De fato, a maioria das coisas que o Fundo de Quintal lançou neste interregno foram DVDs de alguns shows nos quais o repertório era quase todo composto pelos antigos sucessos do grupo e por sambas famosos de antigamente. Os discos de estúdio ficavam muito a desejar se comparados com os do tempo da clássica formação: Arlindo Cruz, Sombrinha, Cleber Augusto, Sereno, Bira Presidente e Ubirany, que de 1982 a 1992 fizeram a cabeça de muitos adoradores do ritmo nacional, inclusive eu. O Fundo ainda teve o Almir Guineto, o Jorge Aragão, o Neoci, o Walter 7 Cordas e o Mário Sérgio (os dois primeiros seguiram carreira solo de grande sucesso - embora atualmente estejam sumidos - o Neoci e o Walter faleceram quando faziam parte do time e o Mário Sérgio ainda não emplacou na carreira solo), bem como ainda está com o Ronaldinho, integrou o baterista Ademir e está estreando o Flavinho, mas nada que se comparasse a esta famosa formação, que, entre outras coisas, nos ensinou a gostar de samba.



Me lembro que aos quatro anos de idade eu estava tomando água com xarope de groselha (uma coisa que as crianças tomavam em quantidades industriais no meu tempo, uma vez que os sucos em pó eram uma porcaria de tão artificial que era o seu gosto e os refrigerantes eram relativamente caros para serem consumidos todos os dias, pois não haviam muitas marcas disponíveis no mercado como hoje; atualmente, não se acha facilmente groselha pra se vender no mercado, e a que existe não é nem sombra da groselha de antigamente, em que bastava se botar um dedo de xarope num copo americano e botar o resto de água para se fazer uma bebida palatável. Hoje em dia, não se consegue o mesmo efeito com meio copo de xarope) dentro de um cantil de plástico e estava observando meu pai passar alguns de seus LPs para fitas cassete (meu pai tinha o costume de fazer coletâneas dos LPs que possuía - e até hoje possui; me lembro das diversas vezes em que fomos juntos, eu e ele, comprar LPs na finada loja Mappin, aquela mesmo da Praça Ramos - em fitas cassete para que pudesse usá-las dentro do toca-fitas do carro) quando escutei pela primeira vez os acordes do samba "Receita da Sorte" (do disco que o Fundo lançou em 1986, "O Mapa da Mina"), notadamente a introdução em que o Arlindo Cruz dá uma castigada no banjo. Foi o primeiro samba que me lembro de ter escutado, e ainda me lembro que aquilo mexeu comigo de uma tal forma que dali pra diante, na altura dos meus quatro anos, eu pude decidir que o samba era o meu gênero favorito...



Mas até agora eu não falei quase nada do disco, vejam vocês como sou tapado! Como já havia dito, esse disco foi uma grata surpresa, pois o Fundo já estava começando a viver de seu passado. Quem sabe foi porque não estava mais gravando muito com bons compositores, e agora voltou a gravar obras mais elaboradas na composição. Nos 30 anos de trabalho solo do grupo, o Fundo neste disco finalmente voltou a ser a reunião dos melhores de seu tempo no pagode, e os fãs esperam que este disco seja apenas uma de outras brasas que ainda virão...


Para ouvir a faixa 12, "Romance Proibido", é só clicar aí embaixo:
http://www.esnips.com/doc/b62c356b-a030-4fe6-9181-58ac0978ba2d/12.-Romance-Proibido

domingo, 21 de agosto de 2011

Que declaração de amor....


Isso aí é a contracapa de um livro de piadas do Ary Toledo, e ao ler isto eu me pergunto o seguinte: como o cara faz pra ser genial e engraçado ao mesmo tempo??? Eu juro que tento, mas não consigo....

domingo, 17 de julho de 2011

Cadáver Pega Fogo Durante o Velório - 1983



01. Porta afora; 02. Altivez; 03. Com todas as letras; 04. Carne no jantar; 05. Cicatrizes; 06. Tal como Nazareth; 07. Vã esperança; 08. Prazer qualquer; 09. Flores de plástico ao amanhecer.


Saudações a todos! Dessa vez eu vou falar alguma coisa sobre um dos discos mais polêmicos e intrigantes que eu já escutei, o que já pode ser notado em seu título e em sua capa, que relembram o famoso e já extinto jornal "Notícias Populares" (do qual se dizia que se fosse espremido e/ou torcido, saía sangue), que para quem não se lembra era um jornal que publicava notícias sensacionalistas de toda espécie, como "Aumento de merda na poupança", "Gorda de 400 quilos vai posar nua"; "Queria troco e levou bala", "Bebê-Diabo arrasa com ritual de umbandista", "Desapareceu Roberto Carlos", tudo com o intuito de fazer da desgraça humana (ou de crônicas policialescas inventadas sobre ela) objeto de riso e interesse do povo...


E, com efeito, podemos dizer que este disco e constitui numa versão cantada do famigerado jornal, e aí está o efeito chocante do disco: Fernando Pellon, que compôs todas as faixas do disco e emprestou a voz para duas faixas, nele falou de temas extremamente mórbidos, como suicídio, violência doméstica, loucura, comparações mórbidas sobre o sentimento amoroso e o caso cômico de um defunto que se indigna por ter seu túmulo ornado com flores de plástico no dia de Finados... Tudo isso cantado por bons nomes de nossa música, como Cristina Buarque e Nadinho da Ilha...


Pois bem, meus caros (e ainda não muitos) leitores, por todos estes motivos citados é uma obra bastante intrigante, por falar dum jeito bem corriqueiro e chão de temas que até hoje são tabus em se tratando de música (afinal não se vê muita gente fazendo música brincando com suicídio ou violência doméstica, tal como vemos nas faixas "Com todas as letras" e "Altivez"); talvez por isso este disco tenha caído nas garras da censura e acabou também caindo no esquecimento apesar da ousadia de sua proposta. O que eu posso dizer é que vale a pena ouvir, mas que cada um faça seu julgamento...


Vamos parar porque a inspiração pra escrever algo prestável e útil já me foge, pois como diria Voltaire, existem duas coisas capazes de torar ridículo mesmo um grande homem: a necessidade urgente e inadiável de falar e o embaraço de não ter quase nada de útil ou inédito a dizer... Quem, como eu, já está há quase dois anos mantendo um blog como este, já se defrontou com este paradoxo várias vezes...


Para ouvir a faixa 04, "Carne no jantar", na interpretação de Nadinho da Ilha, é só clicar aí embaixo:
http://www.esnips.com/doc/91b91def-2751-474a-8aa2-e8928e7bf132/04-CARNE-NO-JANTAR

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Zico e Zeca - Segredo de amor - 1965


01. Nossa Senhora da Penha; 02. Cigarrinha; 03. Prima Porfíria; 04. Vida de Palhaço; 05. Segredo de amor; 06. Vem Moreninha; 07. A saudade dói; 08. Adeus Boiada; 09. Quando a saudade machuca; 10. Desprezo; 11. A verdade do carteiro. 12. Maldosa.


Saudações a todos! Pelas razões que eu já citei, as postagens do blog ficaram mais raras, mas não abandonamos este portal para o infer...digo, mundo que é essse blog que já está há quase dois anos no ar. E vamos fazer o de sempre, que é comentar música de qualidade (já estou há quase duas semanas pra escrever essa postagem, pois fui atacado por uma violenta gripe, e a inspiração estava bem longe), e dessa vez vamos falar de uma grande dupla sertaneja: Zico e Zeca.


Além de ser uma de minhas duplas favoritas, é uma das mais famosas da música sertaneja, fazendo parte de uma família de gigantes deste gênero: são irmãos mais velhos de Liu e Leu, outra dupla sertaneja famosíssima (e que talvez é a dupla que está há mais tempo atuante, contando com mais de 50 anos de carreira; já resenhei um disco deles aqui no blog) e primos de Vieira e Vieirinha (conhecidos por seu talento musical e por sua habilidade em dançar catira). Zico e Zeca atuaram juntos por quase 60 anos, até a morte repentina de Zico (é o que está empunhando o violão - ou será a viola? Ele tocava violão e o Zeca tocava a viola, mas na capa do disco o contorno não está claro - na capa do disco acima), no ano de 2009.


A dupla continuou com o filho de Zico e chegou até a gravar um CD no ano passado, mas o universo da música sertaneja já está dominado pelo "estilo universitário" e não há mais espaço pra o sertanejo "de raiz" (que, em determinado tempo, também foi um grande filão da indústria fonográfica e que à seus interesses foi moldado). E estas últimas palavras em parêntesis que escrevi são para fugir um pouco dessa ladainha: "a música de hoje é uma porcaria, não se faz música como antigamente, isso nem se compara com o créu, e patatipatatá....". Com o tempo percebemos que, por mais que não gostemos dos sucessos populares de hoje, não podemos ficar o tempo todo colocando nosso gosto pessoal de classe média boêmia como o parâmetro que deveria ser seguido pela sociedade; o popular sempre será objeto de estigma, e vira "cult" quando cai no gosto dessa classe média boêmia que citei, que na sua mania de pseudointelectualidade quer ditar o seu gosto asséptico para os que não comungam dele...


Algum filho-da-puta vai me perguntar: "Mas não é justamente isso que você faz no seu blog?" Bem, a esse cidadão eu poderia responder que esse blog é como a minha casa, e como homem adulto e civilmente capaz nela eu faço o que bem entender (se eu quiser cagar no chão da cozinha e deixar uma semana sem limpar, isso é problema meu, muito embora ao saber disso você provavelmente não aceitasse qualquer convite para me visitar ou para comer uma refeição preparada por mim), mas pra não parecer que sou tão radical a ponto de eu ter a ousadia de fazer uma necessidade fisiológica na cozinha, demostrando assim minha condição de macho-alfa (ou de completo retardado), eu digo que não tenho a pretensão de, em "meu saber de ignorâncias feito", mudar o gosto de ninguém: que o povaréu continue ouvindo as músicas de seu gosto, uma vez que isso alegra o espírito e à princípio não faz mal a ninguém, mas que também conheça e não despreze os que, a seu tempo, mostraram ao mundo o seu talento; é como eu digo para os alunos da escola (pública) em que eu trabalho, quando estes me surpreendem cantando ou escutando algo de meu gosto: "Eu não tou dizendo que você tem que parar de escutar funk, mas você também precisa ouvir Bezerra da Silva (ou qualquer outro que me venha à lembrança na hora), precisa ampliar seus horizontes e a sua mente"


E eu acredito que o espírito deste blog seja justamente esse, o de mostrar que eu acredito que em matéria de música existe um mundo para além do funk, dos pagodes e do pop rock mela-cueca e dos cantores evangélicos de voz estrídula, sem entretanto tentar destruir este mundo que eu citei ou me recusando a conhecê-lo...(assim como alguns membros da família real inglesa ainda lêem "O Príncipe" de Maquiavel trancados no banheiro, eu ás vezes me surpreendo escutando um pagode do Exaltasamba ou ouvindo um funk daqueles do tipo do "você, você quer") e de, é claro, ser um espaço onde eu possa dizer o que eu penso sobre tudo o que me rodeia, ou o que me cai nos ouvidos, ou o que consigo depreender das leituras que faço...


Mas e o disco? Olha, meus senhores, o disco é bem legal, e eu acredito que apesar de ele não ser uma obra-prima da música sertaneja, você pode tomá-lo como um bom exemplo de cultura musical caipira; nele podem ser encontradas, toadas, valsas, rasqueados e modas de viola, cantadas com a simplicidade de dois grandes sertanejos, pois a verdadeira música é universal, uma vez que ela sempre se reporta aos sentimentos universais comuns a toda a humanidade. Eu, pelo menos, gostei muito do disco, mas como acabei de falar, meu gosto é suspeito e minha moral é questionável...


Para ouvir a faixa 11, "A verdade do carteiro, é só clicar aí embaixo:


http://www.esnips.com/doc/d30ba8b7-631f-47a4-81c6-6f56ed036fbf/11.-A-Verdade-do-Carteiro

sábado, 14 de maio de 2011

Fernando Costa - Candomblé (É do Norte que vem) - década de 70?



01. Maria Mulambo; 02. É do Norte que vem; 03. Canto a Inaê; 04. Orixá Tempo; 05. Meus Amigos; 06. Pai Pena Branca; 07. Cavalheiro Ogum; 08. Mamãe Dandalunda; 09. Pescador, cuidado!; 10. O lírio do Caboclo Serra Negra; 11. Yaô Darumê; 12. Guerreiro da mata.


Saudações a todos! De uns tempos pra cá, tenho notado que as visitas à este blog tem caído consideravelmente, uma vez que as postagens ficaram menos frequentes; isso acontece porque nosso tempo livre tem se reduzido consideravelmente, e nós procuramos usá-lo inteiramente para nosso descanso. Ora, eu procuro fazer com que tudo, ou quase tudo, que é postado aqui neste blog seja feito com o máximo de carinho e cuidado (não são raras as postagens que foram precedidas por um trabalho de pesquisa sobre o assunto; como eu sou leigo, nunca cito fontes, o que não significa que neste blog eu escrevo simplesmente o que me vem à cabeça e que se fodam os fatos, como se eu fosse um grande sábio!) e algumas vezes isto demanda mais do que um dia para ser feito...


Ou seja, tem ficado um pouco complicado atualizar este blog, pra que ele não fique apenas reduzido aos devaneios de um besta metido a sabichão; o que se bota aqui tem que ter um mínimo de fundamento. E nem sempre nos encontramos suficientemente inspirados pra fazer algo. E depois destas divagações, vamos finalmente comentar a obra. Eu a encontrei por acaso, em divagações pela internet. Como todos sabem, sou um aficionado por música das religiões de matriz afro-brasileira. Um belo dia em que eu estava vadiando vendo uns vídeos no YouTube, encontro por acaso um vídeo com uma das faixas desse disco. Fui até o canal de quem postou esse vídeo e descobri que era um canal para divulgar a obra de Fernando Costa, criado por seu filho.


Fernando Costa é mais uma dessas figuras que tem história considerável dentro da música, mas que foram relegadas ao esquecimento. Gravou alguns discos como cantor de músicas românticas, foi militar da Aeronáutica e também foi compositor e produtor musical. As fontes que pesquisei não dão muitas informações além dessas, mas dizem ainda que ele foi se retirando da carreira musical com o advento da Jovem Guarda. E citam o disco que ora comentamos como o retorno deste à carreira de cantor. Quanto ao disco em si, é uma obra bastante agradável de se ouvir; um violão (com um executor competentíssimo, diga-se de passagem) e um tambor (não pude identificar se eram atabaques, bongôs ou congas) executando serestas, sambas e outros rimos falando das coisas dos terreiros.


Pois bem, é uma obra recomendável para os que gostam da música que fala das coisas do santo e também dos que apreciam a música brasileira... Abençoado seja o filho deste operário da música que foi Fernando Costa, que disponibilzou para a consulta da posteridade uma obra raríssima... Como todas as músicas do LP estão no YouTube e infelizmente não estão disponíveis em outro lugar, eu botei o vídeo correspondente a faixa 03, "Canto a Inaê" Portanto, ó aficionados da música do santo, não me peçam esta obra pra baixar, uma vez que não a tenho em meu acervo particular... Boa audição, pois agora vamos saravar os pretos-velhos na casa de Seu Pena Verde...


domingo, 10 de abril de 2011

Jackson do Pandeiro - ...É Batucada! - 1962

01. Samba do Ziriguidum; 02. Saia rôta; 03. Entra na roda; 04. O pau rolou; 05. Não vou chorar; 06. Jacaré Bebeu; 07. Queima do Judas; 08. A onda passou; 09. O samba melhorou; 10. É de lei; 11. A cadeira do rei; 12. Vai levando; 13. O morro cai.


Saudações a todos! Fiquei um tempo sem fazer nada nesse blog, porque a canseira não me permitiu; se eu fosse me meter a fazer algo, não ficaria muito bom e eu primo pela qualidade de tudo, ou quase tudo que eu ponho aqui neste blog. E vamos, como sempre, mais uma vez falar de música, pois ela tem o poder de nos fazer esquecer ainda que momentaneamente as desgraças da vida e de acalmar o nosso espírito.


Para tanto, como aqui nós só comentamos música de qualidade, vamos comentar o sétimo LP de Jackson do Pandeiro, "...É Batucada!", lançado pela Philips em 1962. Neste LP, Jackson mostra todo seu talento na interpretação de sambas; ele que foi um ícone da música nordestina, mostrou nesse disco que não negava fogo e que sabia muito bem adequar o ritmo da sua voz ao samba, com quem no fim das contas flertou durante toda a sua carreira; se ele resolvesse virar um sambista, teria uma carreira de igual sucesso...


E a capa do disco? Nela podemos enxergar bem o espírito do disco: um mestre do senso rítmico a tocar um pandeiro, um ganzá, um tamborim, um agogô um reco-reco e um afoxé, instrumentos que dão ritmo complementar a batucada, enquanto esta é governada pelos tambores; uma senhora (Almira Castilho, que foi a primeira esposa de Jackson do Pandeiro; enquanto ela foi casada com este mestre, ela apareceu nas capas de quase todos os discos dele e também foi sua parceira na composição de grandes sucessos; morreu em fevereiro deste ano, aos 87 anos) dançando em ritmo aparentemente frenético, demonstrando o poder exorcizador da música e do samba... Nossos agradecimentos ao blog (Ou já seria portal?) "Forró em Vinil" (está na minha lista de favoritos, se você quiser visitar é só procurar na lista que está do lado direito desta página), o blog mais completo em matéria de forró e de música nordestina da web e que disponibilizou ao público esta pérola da música...


Como não poderia deixar de ser, fica a recomendação: não morra sem ouvir este disco! E chega de papo, pois a inspiração para escrever está me fugindo...


Para ouvir a faixa 05, "Não vou chorar", é só clicar aí embaixo:

http://www.esnips.com/doc/d8e50b75-a7d5-44fa-9c51-b7ce9e9cc719/05-N�o-vou-chorar

domingo, 6 de março de 2011

Eu, Adriano Oliveira, 25 anos, brasileiro nato, funcionário público, gordo, umbandista, cachaceiro, fumante e torcedor do E.C. XV de Novembro de Jaú

Essa obscenidade malcopaida da Aracy de Almeida sou eu no meu trampo, numa das poucas fotos em que estou usando meu óculos. Passei quase um ano afastado de minha sede de exercício, prestando serviços em uma repartição da Secretaria da Educação. Deu tempo de pelo menos bater essa foto. Nesse computador que estou sando na foto saíram muitas postagens deste blog...



Antes de tomar mais uma dose de minha cachaça favorita (Rainha Paraibana), batemos esta chapa com o celular...
Hoje em dia, é difícil encontrar gente que aprecie (sem vício) beber cachaça pura....



Uma das dificuldades de ser gordo é o fato de que não se encontram camisas de times pequenos em tamanhos superiores ao G; pra bater essa foto tive que pegar essa camisa de meu irmão, que é um sujeito magro. Por aí vejam vocês o que é se torcer pro XV de Jaú: batemos uma foto que nos faz parecer que estamos a parir 3 crianças, levamos esporro do irmão que reclama que a camisa esgarçou e ainda publicamos isso na web, só para demonstra nosso amor a um timeco da terceira divisão do Campeonato Paulista...



Nesta foto onde estou dando uns tapas no cachimbo de Pai Jacó (o cachimbo de jurema que uso pra fumar fumo de corda), pode se notar que, além do colete cervical (de vez em quando, sobretudo na época do frio, o meu pescoço trava e dói de tal forma que é preciso usar por algumas horas um colete cervical para ele se endireitar e parar de doer), tenho uma pança de homem de 45-50 anos de idade...Realmente não estou em meus melhores dias nesta foto



Trajando o hábito de umbandista logo após à cerimônia de minha iniciação religiosa (batismo), que foi no dia 03 de julho do ano passado..
Como todos podem notar pela cara de merendeira de escola pública, eu sou um homem gordo, como fui em quase toda a minha vida...




Só pra constar, o título desta postagem foi roubado descaradamente de um filme alemão e não foi devolvido....

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

No dia que eu nasci, metalúrgicos não gostam de metal


Saudações a todos! Essa figura aí é um recorte da "Folha de S. Paulo" - um dos grandes jornais do Estado e talvez do Brasil (e por esta razão tão criticado pela sua falta de liberdade editorial), datado do dia 02 de novembro de 1985, que não por acaso é o dia em que eu nasci. Antes de entrarmos nos detalhes do que vai neste recorte, contemos a história desde o comeco:

No final da semana passada, o Grupo Folha disponibilizou na internet a versão integral de quase todas as edições dos jornais que editou, e por algumas horas chegou a disponibilizar grauitamente a versão digital deste acervo para consulta. Hoje, tal consulta só pode ser feita mediante pagamento de uma taxa. Aproveitei este período para ver o que saiu na Folha no dia em que eu nasci, e deparei com este recorte, que está no pé do caderno "Ilustrada" do já citado dia de meu nascimento.

Nesta matéria, alguns operários da Saab-Scania são entrevistados para saber se gostam de heavy metal, e todos são unânimes em dizer que não, e citam como gosto musical a MPB, o samba e o rock nacional (que naqueles tempos de fim da ditadura estava bombando). Dizem não gostar de metal pelo fato de acharam a música barulhenta demais e pelo fato de as letras estarem em inglês; apesar disso não demostraram ser intolerantes com o metal (como os poucos leitores deste blog sabem, sou bastante intolerante com gosto musical; embora digam que gosto é como cu - cada um tem o seu - digo que em matéria de música uns mantém o cu sempre limpo e outros mantém o cu sem conhecer o que é papel higiênico) e não se afligiriam se tivessem um filho metaleiro.

Acredito que esta matéria de jornal é fruto de um tempo em que o Brasil estava começando a se livrar das heranças da ditadura militar (que mesmo depois de seu fim ainda se faziam bem vivas e presentes) e fazia isso principalmente através da contracultura, como se quisesse tomar um porre pra descontar os 20 anos de "abstinência" da ditadura. Por essa época pode-se dizer que vivemos nosso 1968 tardio (quase 20 anos depois!) e pacífico. Ser jovem no Brasil dos tempos de minha primeira infância era ser um rebelde sem causa temporário; era uma malandragem sem malícia alguma, de uma vida que deveria ser vivida o mais intensamente possível.

Hoje em dia, 25 anos e poucos meses depois, os metalúrgicos desta matéria (se ainda estão vivos) já devem ter se aposentado, ter filhos casados e talvez já sejam até avôs. E a juventude frenética daqueles tempos, pelo menos os que foram suficientemente morigerados para escapar das overdoses e da AIDS, já são maduros quarentões, alguns pais de filhos adolescentes que hoje curtem o pancadão dos morros cariocas. E eu apenas passei de bebê recém-nascido para estar aqui escrevendo o que penso da vida neste blog...

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Só acredito em um Deus que saiba dançar (repostagem)



Saudações a todos! Aqui vai um texto que eu cacei na web sobre a preservação de nosso patrimônio cultural, Foi escrito por uma professora, mas nada que jogue um tom bicha nessa postagem:


Em um dia desses eu ouvi de uma aluna que ela tinha parado de fazer capoeira porque o pastor da sua igreja disse que capoeira é coisa do demônio já que tinha tambor, tinha cantoria. Berrei um o que indignado, parei a aula, parei tudo e fomos conversar sobre esse negócio de que tudo que vem da cultura africana ter virado coisa do demo. Outra se recusou a aprender a música " Canto de Ossanha" porque a letra falava " ..Xangô me mandou lhe dizer". Xangô é coisa do demônio.


Já se deram conta disso? Os evangélicos radicais repugnam a marca do povo negro em nossa cultura e não estou falando somente dessa guerra santa contra as religiões afro-brasileiras. Falo da música, da dança, do folclore, de tudo aquilo que o povo africano nos dá em riqueza cultural e identidade. Capoeira é coisa do demônio porque usa tambores. Tambor é coisa de candomblé, coisa de macumbeiro. Macumbeiro é coisa ruim. É coisa do demo.


As lendas brasileiras, o Saci, o Curupira, o Boto, a Mula sem cabeça. tudo coisa do demo. No mês de agosto pisei miudinho porque resolvi contar as lendas brasileiras para meus alunos e algumas mães reclamaram que eu estava ensinando coisas do demônio para seus filhos! Saci agora virou demônio, minha gente. Monteiro Lobato deveria ter sido um adorador e o Sítio do Pica Pau Amarelo um antro de perdição! E a cultura oral brasileira? Vai pra onde? E os criadores de Saci? O que são?


O samba, o gingado malemolente, a brejeirice brasileira...tentação do demônio. Não pode sambar. Não pode sacudir o famoso e adorado "traseiro" da mulata brasileira porque a bunda deve ser coisa do demônio, atenta o homem, desvia de alguma coisa. A bunda brasileira é um pecado espiritual. A bunda brasileira é negra, vale lembrar.Vá entender...


Dança e festa não são apropriadas porque esse deus aí não gosta de batuque, não gosta de mulata, de samba, de bunda, não gosta de riso, de gargalhada, de cachaça e de boêmia. Usa terno cafona, ouve música de gosto duvidoso com sotaque gringo e gorjeios de voz norte-americanos. Fornica, mas fornica dizendo que não gosta muito, pra procriar somente. E se goza, goza escondido com medo da culpa do próprio gozo. Esse deus não é, realmente, brasileiro. É um deus branquelo, preconceituoso e doente do pé. Um deus chatérrimo, diga-se de passagem. A cultura africana que veio para o Brasil nos navios negreiros é tratada como manifestação do coisa ruim. Então a fé tem que ser branca, alva, asséptica, silenciosa. Agressiva contra aquilo que é diferente.


Eu acho que todo mundo pode e deve acreditar no que bem entender. O exercício da fé é individual e, na minha visão, muito saudável. Acredite, apóie-se, dedique-se a que te faz bem e vá cuidar de sua vida. Se quiser passar suas sextas e sábados em reza profunda, em meditação, em sexo tântrico, em adoração à lua, ao pé de cachimbo...por mim! O final de semana é teu. Eu não saio por aí querendo fechar templos budistas, nem igrejas católicas. Não maldigo Buda, Shiva, não quero que as pessoas parem de cantar " hare, hare krishna" e vendam seus incensos por aí. Para mim, cada um na tua e tá tudo ótimo. Antes com fé do que sem fé alguma.


Eu gosto do batuque. Eu gosto do samba. Gosto de negão. Gosto de contar as histórias que ouvi, das noites de lua cheia, das traquinagens do saci, gosto de saber que sou filha de Iansã e ela briga por minha cabeça com Yemanjá, adoro ler a mitologia africana, da mesma forma que adoro a grega. Gosto da miscigenação do meu país e, principalmente, me orgulho de dizer que minha pátria é reconhecida pela sua capacidade de respeito religioso, pela aceitação das diferenças. Será que ainda é?


Cresci em Salvador que transforma a lavagem da escadaria da Igreja do Senhor do Bonfim - sincretizado com Oxalá - uma festa religiosa e profana ao mesmo tempo. Gosto de tomar banho de pipoca porque isso é uma forma ancestral de se proteger meu corpo das doenças, culto esse diretamente relacionado a Omulu, o velho e bom São Lázaro. Aprecio essa riqueza cultural. Gosto disso porque é a cara do Brasil que é todo misturado. Portugueses , negros e índios fizeram a nossa nação. Depois uma galera veio chegando, italianos, japoneses, espanhóis, todo mundo se misturando e deixando um pedacinho de sua cultura natal em nós. Mas ainda é o trio primordial ( português-africano-índio) que faz a nossa identidade, que dá a nossa cara. Por que só a cultura negra é assim tão maligna??


De onde surgiu isso?Quem disse que Deus é europeu?? Quem afirma que tem cor de pele, que tem preferências entre a forma de se cultuar a sua divindade? Por que é a cultura branca européia que é a boa cultura? Não entendo isso.Não entendo tanto negro repudiando a sua própria história em função de crença religiosa.Não é somente fé. É cultura popular. É a nossa história, nosso passado, nosso DNA cultural. Eu não sou preta, nem mulatinha. Pra passar por morena jambo eu tenho que tomar muito sol. Não posso ser chamada de ariana, não sou branquela. E também não sou índia. Sou um mix. Sou cachaça com caju. Sou quindim. Sou mandioca frita. Sou acarajé com coca-cola. Sou pato no tucupi. E muito me orgulho disso, da minha história, da minha linhagem mestiça porque eu sou o que sou.


Não entendo e não aceito essa forma de viver a espiritualidade, a necessidade de esmagar uma forma antiga e autêntica de viver a religiosidade, não entendo isso. O que tem de tão ameaçador na língua africana dos pontos do Candomblé? O que tem de tão assustador em um caboclo de Umbanda? Em uma festa de erê? Macumba? Medo de trabalho, de feitiço, da maldade? Pois eu sei que se pode fazer magia com um terço na mão porque magia é a capacidade de alterar a realidade através da intenção. Posso fazer isso usando qualquer língua, qualquer rito. Magia é magia. Bem é bem e mal é mal.


Mas não venham querer que eu mude a minha identidade. Eu sou assim: um tanto branca, um tanto bugra e um tanto negra. Sou Brasil da cabeça aos pés. E rezo assim, em três raças. E eu, tanto Brasil que sou, não sou menor que nenhum outro, seja ele totalmente ariano, totalmente negro, totalmente oriental. Cada um tem suas características, suas peculiaridades e é isso que se chama de diversidade. Sou como sou e sei disso.


Daqui a pouco vão dizer que o samba, que o chorinho, que o pandeiro, que o zabumba é coisa do demo porque tem preto no meio, que veio da negada, não presta. Toda mulher que sair de vermelho na rua será apedrejada porque está de Pomba Gira e Pomba Gira é coisa do demônio. Volúpia é coisa do diabo. Bundão sambando é tentação. " A partir de hoje as mulheres bundudas estão proibidas de sambar porque é coisa do demo". Que horror.


A imagem da Nossa Senhora já foi chutada e chamada de imagem horrorosa. Pode até ser uma estátua meio feínha, mas é a Nossa Senhora, é a Mãe, é a representação todas as deusas antigas. É Oxum, é Yemanjá, é Ceres, Deméter, é Isis. É a lembrança do culto à Grande Mãe que corre pelo tempo. É muito mais antigo que uma imagem de gesso. É o passado. Inconsciente coletivo da Humanidade. Estou assustada com a empreitada dos evangélicos contra a nossa cultura popular. Eles são organizados politicamente. São efetivamente ativos. Vão conseguindo espaço através do discurso de prosperidade e abundância. Sacodem a Bíblia Sagrada na cara do passado como se ela justificasse uma guerra santa dessas.


E a minha forma de luta é continuar brigando pelo direito à sobrevivência do Saci, da Iara, do Curupira, do samba, da bunda rebolante, do caxixi, do atabaque, da mandinga, do tambor de crioula, das cirandas, do coco, do jongo, das letras de Aldir Blanc, dos afro-sambas de Vinícius e Baden, do banho de pipoca, do abará com vatapá, da capoeira angola e regional, de Jorge Amado, Dorival Caymmi, de Pierre Verge, até da Mula sem Cabeça ,que eu não vou lá muitos com os cornos porque eu ouvi dizer que nas noites de lua cheia ela sai correndo de cemitério em cemitério à procura de cadáveres de crianças que foram enterradas sem ser batizadas e mesmo essa história ter chegado aqui através dos porutgueses, e não dos africanos, eu não quero que ela morra. Porque um mundo sem Mula sem Cabeça e Saci, sem cachaça jogada no chão pro santo, sem a malandragem do samba malaco, sem o carnaval, ah, meu filho, esse mundo é muito chato e sem graça. Tô a fim dele não. Me deixa sambar! Me deixa cantar pra subir. Me deixa ser brasileira, vai! Me deixa!


E pra finalizar, eu coloco aqui alguns vídeos da curimba do Terreiro do Pai Maneco, que está em Curitiba. Já falei muito de Seu Sete (muita gente entra nesse blog pra ver as resenhas que fiz do disco dele - a resenha do disco "Sete Rei da Lira" e do disco da Genimar são os textos mais lidos deste blog, devem ter cada um umas 200 visualizações), e acredito que na parte musical o Terreiro do Pai Maneco é o legítimo sucessor dos trabalhos de Seu Sete da Lira de D. Cacilda (não é à toa que Pai Fernando, o dirigente deste terreiro, também trabalhe com Seu Sete da Lira, ou pelo menos trabalhava). Eu não conheco hoje em dia nenhum terreiro que consiga casar tão bem a musicalidade própria da religião com a música popular, mostrando a óbvia ligação que existe entre elas....


Lá na Aruanda, o Caboclo Giramundo; e na encruzilhada, Seu Sete da Lira, protetores dos curimbeiros, estão apreciando e inspirando esse pessoal mostrar a força de nossa religião e de nossa cultura...Vamos ao que interessa. Duas músicas gravadas pelo Zeca Pagodinho e uma apresentada num festival cultural deste templo...







sábado, 15 de janeiro de 2011

Faramin Yemanjá - 1971?


01. Louvação a Janaína; 02. Corre Gira – Flores para Yemanjá; 03. Louvação a Oxossi; 04. Mironga de Preto Velho; 05. Seu Baluaê; 06. Louvação a São Jorge; 07. Louvação a Xangô; 08. Imberê; 09. Louvação a Oxalá; 10. Louvação a Yemanjá; 11. Louvação aos Caboclos; 12. Louvação à Cumieira; 13. Tem Dendê; 14. Sapo Macumbeiro; 15. Cruzambê;


Saudações a todos! Voltando a fazer o serviço rotineiro, vamos resenhar mais uma peça musical dos meus guardados. Pra hoje, eu escolhi um dos mais conhecidos discos umbandistas, o "Faramin Yemanjá", gravado na inspiração de Tancredo da Silva Pinto, expoente da Umbanda conhecido pelo seu viés fortemente "africanista". Algumas das faixas do disco foram compostas pelo próprio Tancredo, e muito provavelmente ele também canta em algumas delas.


Mas antes de começarmos a discutir o disco em questão, vale a pena tratarmos de alguns aspectos relativos à gênese do movimento umbandista. Até o começo da década de 40, não havia uma distinção muito clara entre a Umbanda e o kardecismo, apesar desta distinção já estar posta desde o princípio do movimento umbandista; a maioria dos umbandistas acredita que a Umbanda enquanto movimento religioso surgiu oficialmente em 15 de novembro de 1908, quando Zélio Fernandino de Morais, na época um jovem de 18 anos, teria recebido pela primeira vez o "Caboclo Sete Encruzilhadas" em público, durante uma sessão kardecista em Niterói. Ao ser repelido daquela sessão, por ser visto como uma entidade inferior e pouco evoluída, o Caboclo Sete Encruzilhadas anunciou que no dia seguinte fundaria na casa de seu médium um novo culto, baseado no evangelho cristão e onde os espíritos dos antigos indígenas e dos ex-escravos poderiam "trabalhar" em prol da humanidade, e que este culto teria o nome de UMBANDA.


Apesar da imensa maioria dos atuais umbandistas estarem, na forma em que praticam a Umbanda, em muito distanciados do entendimento religioso e dos preceitos de culto praticados pela corrente de Zélio Fernandino e do Caboclo das Sete Encruzilhadas, os umbandistas, ou pelo menos as federações que representam os templos religiosos e os intelectuais umbandistas mais tidos em conta tomam o citado acontecimento de 1908 como o mito fundador desta religião. Isto em muito se deve à atuação de Ronaldo Linares, atual presidente da Federação Umbandista do Grande ABC (pra quem não sabe, sobretudo os leitores estrangeiros deste blog - são poucos, mas existem! - e os leitores de fora de São Paulo, Grande ABC é o conjunto das cidades paulistas de Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, que são cidades industriais vizinhas à cidade de São Paulo), que ao criar o primeiro curso de formação sacerdotal umbandista tentou pesquisar as origens desta religião e de alguma forma chegou à figura de Zélio Fernandino.


Pois bem, esta umbanda dos tempos primordiais era, apesar de tudo, ainda muito ligada ao kardecismo (basta lembrar que o livro "O Espiritismo, A Magia e as Sete Linhas de Umbanda", tido como o primeiro livro umbandista, foi escrito em 1933 por Leal de Souza, notório kardecista de seu tempo). Só a partir da década de 40 do século passado é que a Umbanda e o kardecismo se separaram definitivamente. Nesta época, tanto o kardecismo como a Umbanda eram movimentos religiosos com bastante aceitação dentro da classes médias; entre os fomentadores destes movimentos religiosos, encontrávamos os nomes de profissionais liberais como médicos e advogados, militares de alta patente, entre outros. Talvez por esta razão, interessava elidir do entedimento da religião umbandista qualquer forma de religiosidade ou de manifestação que de alguma forma estivesse ligada à cultura negra, como o uso de tambores, por exemplo; desta forma, no entendimento de tais pessoas, a Umbanda deveria se embranquecer para ser aceita socialmente num país oficialmente católico.


Somente a partir do final da década de 40 e início da década de 50 do século passado, surgiram intelectuais umbandistas que não só valorizavam o que havia da cultura negra dentro do movimento umbandista como ligavam a legitimidade deste movimento à presença da negritude dentro da Umbanda. Tancredo da Silva Pinto é um destes intelectuais (o principal deles). Apesar de hoje em dia a maioria dos templos umbandistas conviverem em seu culto com elementos da cultura negra, esta questão ainda está longe de ser encerrada (quem acompanha comunidades umbandistas em redes sociais, ou participa de listas e fóruns de discussão umbandistas na web, sabe que volta e meia surgem polêmicas sobre o uso dos atabaques, o sacrifício ritual de animais, o culto a exus e pomba-giras e até mesmo o uso do fumo e das bebidas alcoólicas e sabe bem do que falo).


Em louvor desta corrente africanista, conhecida como Omolokô, se gravou o disco que ora resenho. Foi lançado em 1971, mas as gravações parecem ser bem mais antigas, pelo menos parece que são de uns 20 ou 30 anos anteriores ao lançamento do disco. Para definir a obra como um todo, poderíamos usar a seguinte oração, que consta na contracapa do do disco: "São toadas, sambas, jongos, batuques e catimbós autênticos. São novos subsídios para o estudioso dos cultos afro-brasileiros; ao místico, aficionado da Umbanda, páginas originais cheias de poesia e de religiosidade".


O mérito do disco está justamente nesta poesia e nesta religiosidade, que coloca a música de terreiro em ligação com suas raízes na música popular. A corrente umbandista do Omolokô foi a primeira a defender publicamente (além dos vários livros que escreveu, Tancredo da Silva Pinto foi fundador de diversas federações umbandistas e escreveu artigos sobre Umbanda para diversos jornais de grande circulação) a beleza da Umbanda na sua influência negra, o quanto ela é o resultado da convergência de vários sistemas religiosos e o quanto ela está presente em nossa cultura, principalmente na nossa música...


E vamos ao colírio alucinógeno...


Para ouvir a faixa 11, "Louvação a Yemanjá", é só clicar aí embaixo:

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011