quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Sobre uma paixão de vida (repostagem)



Saudações a todos! Já faz muito tempo que eu não escrevo, e confesso que até pensei em abandonar este blog, mas eu sinto que estou cada vez mais cansado, enfadado da vida e com mais necessidade de me desapegar da vil realidade, e uma das formas que uso para fazer isso é passar horas e horas escutando música e caçando novidades para ouvir na web...


E agora mesmo estou dividindo minha atenção para escrever algo prestável (até porque, além de prezar pela qualidade do que posto aqui no blog, estamos no primeiro post do ano, apesar de já estarmos em abril!) com a audição dos belos sambas que foram apresentados na fase de "vela azul" do Samba da Vela (para quem não sabe, o Samba da Vela é uma comunidade de sambistas que se reúne todas as segundas na Casa de Cultura de Santo Amaro, e que preza pela divulgação de novos sambas e de novos compositores, bem como de uma nova forma de apreciar estes sambas; o tempo de duração do samba é determinado pelo consumir de uma vela que ao ser acesa inicia o samba, e ao se extinguir totalmente o encerra; o público se senta em volta dos pagodeiros, e aprecia os sambas através de um caderno impresso, e a fase de vela azul é a de apresentação de sambas que podem vir a compor este caderno que determinará os sambas que serão apreciados pelo público durante um certo período de tempo; geralmente se lançam de um a três cadernos por ano. Eles já lançaram há alguns anos atrás um CD com os sambas mais apreciados - e que todos os que gostam de samba não devem deixar de ouvir - e estão para lançar um segundo, certamente um dos lançamentos mais aguardados do mundo do samba)...


Ou seja, eu estou tentando (inutilmente, de certa forma!) dividir minha atenção com todas estas coisas; por vezes tenho que parar de escrever para apreciar um samba com mais detença. E eu sei que se eu ficar parando muito, vou perder a vontade de escrever e se eu retomar em outro dia, a inspiração inicial já terá fugido.. Some-se a isso o velho dito de Voltaire que persegue todos os blogueiros do mundo e todos os que passam pelas mais movimentadas redes sociais (e que eu já citei varrias vezes aqui, mas é tão sábio e tão incisivo que eu nunca me cansarei de citá-lo): "Existem duas coisas capazes de tornar ridículo mesmo um grande homem: a necessidade de falar e o embaraço por nada ter a dizer" Mas pelo menos hoje, eu tenho algumas linhas em mente para falar de uma das paixões de minha vida: o Grêmio Recreativo Cultural, Social e Escola de Samba Unidos de Vila Maria.


Muita gente não entende isto, mas esses pavilhões da foto representam muito mais do apenas uma escola de samba; representam a vida, o suor e a alegria de muita gente que fez uma escola de samba fubanga e que não atraía o interesse de quase ninguém do bairro se tornar uma das escolas de samba mais prósperas e respeitadas de São Paulo, bem como fez com que a vida e alegria de um bairro inteiro girasse em volta dessa escola. Mesmo eu, que vivi toda a minha vida próximo da Vila Maria (a bem dizer, eu fui criado lá!) até o ano de 1998 eu não sabia que a Vila Maria tinha uma escola de samba; em um belo dia deste ano, brinquei com um grande amigo meu que deveríamos fundar uma escola de samba que se chamasse "Unidos da Vila Maria", no que esse amigo respondeu que essa escola de samba já existia, e que seu sobrinho fazia parte da harmonia da escola tocando cavaquinho; que ela já havia disputado o Grupo Especial por alguns anos (de 1969 a 1973, pra ser mais exato) e uma vez ficou em quarto lugar (posição que só se repetiu em 2005), mas que estava bem caída, no terceiro ou no quarto grupo das escolas de samba de São Paulo; que a escola não atraía o interesse do povo porque ela sempre tinha sido o local onde se reuniam os maus elementos e os consumidores de drogas do bairro (e que por esta razão, quase sempre acontecia alguma confusão nos ensaios da escola), enfim, que ali não era um ambiente familiar...


Neste ano a Vila Maria, depois de quase ter encerrado suas atividades, faturou o título do quarto grupo das escolas de samba; aí começaram a aparecer nas ruas, nos carros e nos estabelecimentos comerciais do bairro adesivos, bandeirolas e pessoas com camisetas da escola de samba; ficamos dois carnavais desfilando no terceiro grupo, para em 2000 faturarmos o vice-campeonato deste mesmo grupo e subirmos para o Grupo de Acesso no ano seguinte. No carnaval de 2001, havia uma intensa expectativa de que, depois de 15 anos longe do Grupo de Acesso, a Vila voltasse ao Grupo Especial depois de quase 30 anos longe dele. E não fomos traídos: neste ano faturamos o título do Acesso e voltamos ao Grupo Especial, onde estamos até hoje. E com um belíssimo samba, que todos os vilamarienses nunca esquecem, e do qual aqui reproduzo seus versos mais marcantes: "Com a minha bateria/eu vou/Verde e branco é alegria/amor/Vila Maria está no ar/Faz pulsar meu coração/E na avenida mostra sua tradição".


Me lembro bem que foi um sufoco convencer a minha avó a irmos juntos na Rua Kaneda (neste época, era nessa rua que havia um barracão aonde a escola guardava os instrumentos e algumas fantasias) na comemoração que estava sendo feita por causa deste título; também consegui convencê-la a me comprar uma camiseta bem simples da escola de samba (que não me serve mais há algum tempo, mas que tenho guardada comigo até hoje). E quando eu ouvi pela primeira vez de perto aquela bateria tocando, a paixão me pegou definitivamente...Ali mesmo não tive dúvidas que o G.R.C.S.E.S. Unidos de Vila Maria seria a minha escola de coração... Daí para a frente, a escola de samba voltou a ser incorporada ao bairro, bem como passou a ser um ambiente seguro e familiar.


No ano de nossa volta ao Grupo Especial, os ensaios eram realizados no estacionamento do antigo "Sacolão" (uma iniciativa frustrada dos tempos em que a Erundina foi prefeita de São Paulo, que criava mercados populares pra vender produtos hortifrutigranjeiros a preços subsidiados. Alguns desses sacolões prosperaram, mas o da Vila Maria foi logo abandonado; seu imponente prédio ficou anos subutilizado - hoje é um depósito de alimentos da prefeitura - e o enorme estacionamento virou área de lazer, onde por cerca de um ano a escola de samba fez seus ensaios), e como a entrada era franca, atraía muita gente, principalmente os moradores próximos do lugar. E claro que isso mais do que ajudou a escola de samba a se tornar um ambiente familiar. Algum tempo depois ganhou a sua atual quadra, ao lado do CDC Cecília Meirelles e quase na beira da Via Dutra. Hoje é preciso pagar para se assistir um ensaio na quadra, mas pelo menos sabemos que iremos nos divertir em um ambiente seguro, onde hoje famílias inteiras lotam o recinto em todos os ensaios e eventos ali realizados...


Neste período em que estamos no Grupo Especial, tivemos como glória principal o vice-campeonato em 2007; me lembro bem de quando o troféu chegou na quadra, e de como eu me vi refletido pulando e gritando em sua superfície prateada. Aquela alegria é algo que não esquecerei mais, assim como o desarranjo de que padeci logo após ter tomado chope em temperaturas vulcânicas. No ano seguinte, fizemos um desfile impecável sobre a imigração japonesa, e éramos apontados por todos como favoritos ao título. Mas ao término da apuração ficamos só em quarto lugar. Sinceramente falando, aquele dia foi o dia mais triste da minha vida.


Estava junto com vários vilamarienses acompanhando a apuração na quadra, e quando ficou evidente que havíamos perdido o título (faltavam ainda, salvo engano, uns três quesitos para serem julgados) um monte de gente começou a chorar por todos os cantos, tanto torcedores como membros da diretoria, da harmonia, da bateria, os casais de mestre-sala e porta-bandeira...Eu mesmo até hoje não entendo porque não chorei também (talvez pelo fato de que fui educado no mais tolo, retrógrado, persistente e injustificável de todos os preconceitos: que homem de verdade não chora) mas sei que foi algo muito triste e revoltante de se ver... A partir daí, perseguimos o título do carnaval, mas nem a qualidade dos desfiles e nem as colocações obtidas (talvez o terceiro lugar do ano passado seja uma exceção) conseguiram fazer melhor do que 2007 e 2008.


Eu acredito que ainda não ganhamos o título porque de certa forma os jurados que jugam o desfile são bastante tendenciosos e favorecem muito as escolas mais tradicionais (o acontecido na apuração deste ano ilustra muito bem isso). Pelo que acompanho do carnaval e dos desfiles das escolas de samba, não há escola que mereça ser campeã mais do que a Vila Maria. As que ultimamente ganharam os desfiles já estão (com exceção da Império de Casa Verde) entulhadas de títulos, e será indiferente um troféu a mais ou a menos para elas; mesmo que elas sejam vitoriosas, elas não tem conseguido fazer um desfile francamente superior ao da Vila Maria (o que tem sido também um empecilho pra se apurar um campeão do carnaval, uma vez que as escolas estão cada vez mais luxuosas e iguais entre si, não existindo um desfile que tenha sido francamente inferior ou até mesmo superior a outro. E isso dificultou muito a parada)...


De resto, é mais do que justo que a trajetória que em 15 anos nos tirou do quarto grupo e da quase extinção para o vice-campeonato do Grupo Especial, para 5 estandartes de ouro consecutivos como melhor bateria do Carnaval de são Paulo transformando-a em uma das escolas de samba mais respeitadas e prestigiadas da cidade seja coroada com um título do Grupo Especial... E é justamente isso que todos os vila-marienses desejam. Quando penso em tudo isso, sinto orgulho de toda esta história se relacionar com o bairro onde a bem dizer fui criado e passei alguns dos melhores momentos de minha vida, e muito embora eu ainda não tenha tido o privilégio de desfilar pela minha amada escola, frequente os ensaios numa frequência bem menor do que a que eu gostaria e não tenha ainda conseguido (em virtude dos compromissos) frequentar a escolinha da bateria para futuramente integrar este time vencedor de ritmistas, me sinto também parte dessa história de luta e de algumas vitórias...



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